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Luis Gomes sobre a educação
a distância: a instituição que não tem EAD está ficando para trás
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O avanço da educação a distância deverá gerar um sistema híbrido, no
qual as novas tecnologias da comunicação serão incorporadas às salas de
aula convencionais, assim como algumas características do ensino presencial
serão mantidas. Com isso, a figura do tutor ganhará ainda mais importância,
na medida em que ele desempenha um papel central no processo educacional.
Esta é a opinião do advogado Luis Gomes, presidente da Associação Nacional
de Tutores (Anated), criada em 2009 como uma reação às resistências - que,
embora estejam diminuindo, ainda existem - à educação a distância no
Brasil.
Em entrevista para a revista Ensino Superior, Gomes discorre sobre o
papel do professor-tutor e suas atribuições, considerando-o peça
fundamental também na gestão do curso. E destaca o movimento de
consolidação de um novo cenário, que impõe desafios às instituições, seja
no sentido de fortalecer suas estratégias de inserção no segmento do ensino
a distância, seja na valorização da figura do tutor, já que este é o
responsável pela interface da instituição com os alunos.
No site da Anated, associação liderada por Gomes, é possível encontrar um
banco de currículos de profissionais interessados em trabalhar como
tutores.
Ensino Superior - Quais são as qualificações de um bom tutor de educação
a distância?
Luis Gomes - Hoje não existe uma parametrização do que é
necessário para trabalhar como tutor. Geralmente, as instituições de ensino
fazem uma capacitação ou um curso de formação e a partir daí o tutor começa
a atuar. Diante disso, a nossa proposta é que sejam criadas diretrizes e
uma normatização para o exercício da tutoria, pois atualmente cada um faz
aquilo que acha melhor para si.
ES: Quais seriam, então, os parâmetros para a tutoria?
Um bom tutor precisa de uma boa base pedagógica e metodológica. O tutor
precisa de habilidades novas porque a educação a distância é uma modalidade
nova. Precisa saber usar as novas tecnologias e estabelecer um bom
relacionamento com os alunos. Existem professores que têm 30 anos de
experiência, têm uma carreira sólida na educação presencial e quando vêm
para a educação a distância não dão certo porque não estão aptos a
desempenhar as funções necessárias. Não porque sejam maus profissionais,
pelo contrário, mas a educação a distância exige domínio das novas
tecnologias de comunicação e capacidade de potencializar a interação dessas
tecnologias no campo educacional.
ES: O que diferencia um tutor de um professor?
Na verdade é a mesma coisa. O que defendemos, enquanto associação, é
que o tutor seja um especialista. Não adianta a instituição ter mestres e
doutores, produzir um bom material didático, fazer uma boa preparação de
todo o processo acadêmico e, na hora de efetivar a aprendizagem, ter um
tutor despreparado. Pois o tutor é quem aplica o conteúdo na prática. Se o
tutor está mal preparado, todo o trabalho anterior cai por terra. Por isso,
o tutor tem de ser um professor e, mais do que isso, um professor
especialista na aplicação das novas tecnologias à educação e nas
metodologias do ensino a distância.
ES: Diante desse novo cenário e do avanço da educação a distância, o
senhor acredita que o professor também terá de incorporar as habilidades de
um tutor?
É fundamental superar essa distinção entre educação presencial e educação a
distância que existe no Brasil e que leva as pessoas a acreditarem que a
educação a distância é "inferior". Na Europa, por exemplo, isso
não existe. Educação é educação. Acredito que haverá um movimento de
aproximação. A educação presencial vai incorporar, cada vez mais, as novas
tecnologias, e a educação a distância vai, cada vez mais, se aproximar do
aluno. É, então, um sistema híbrido. Com a incorporação das novas tecnologias
na educação presencial, as funções do professor vão se aproximar das
funções do tutor.
ES: Como deve ser a formação de um tutor para que ele se qualifique
e se consolide como um profissional?
Essa é uma questão em discussão na categoria que vai orientar todo o
processo de formalização da profissão no Catálogo Brasileiro de Ocupações
do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). É importante descrever essa nova
ocupação porque dentro da normatização da educação a distância do
Ministério da Educação existe a função do tutor, só que a profissão não foi
formalmente criada. Por isso, uma das nossas frentes de atuação é a
formalização da categoria junto ao Ministério do Trabalho. Mas para isso é
preciso haver um consenso, o que ainda está sendo construído.
ES: Quantos tutores existem no Brasil? O senhor acredita que essa função
tende a se consolidar como uma profissão?
Acredito que sim. Hoje existem cerca de 40 mil tutores no Brasil e quase
três milhões de alunos na educação a distância, e o MEC estabelece o limite
de 40 a 50 alunos por tutor. Muitas instituições ainda não cumprem a
determinação, pois a educação a distância é muito nova no país e começou de
maneira muito dispersa e desregulamentada, com uma infraestrutura muito
precária. Este cenário está mudando com a gestão da Secretaria de Educação
a Distância do MEC, que passou a fazer várias exigências em relação à
estrutura e às condições de oferta, incluindo a definição do número de
alunos por tutor e por professor. Além disso, está sendo criado o Sistema
Nacional de Avaliação do Ensino Superior (Sinaes) para a educação a
distância, que estabelece alguns contornos para o exercício da tutoria. No
que diz respeito à formação, por exemplo, o ideal é que o tutor seja
especialista na sua área de atuação.
ES: De que maneira a instituição de ensino pode atuar com a finalidade
de fortalecer o trabalho do tutor?
Não adianta investir em publicidade, em processo seletivo, pois quando
o aluno se depara com um tutor despreparado, seja no polo presencial ou no
ambiente on-line, pode acabar desistindo. O tutor tem de ser muito bem
preparado tanto do ponto de vista pedagógico como do da gestão.
ES: E o que é gestão no caso do tutor?
Liderança, trabalho em equipe, gestão da inadimplência, redução da
evasão, aumento na capilaridade de matrículas. É preciso incorporar novas
habilidades e competências ao papel do tutor e não tratá-lo apenas como
alguém que coloca a videoaula no DVD ou que reporta as dúvidas ao
professor. A instituição precisa perceber que o tutor pode ser um aliado no
fortalecimento da EAD. Ele pode ser uma figura importante, por exemplo,
para estimular o aluno a concluir o curso, a construir um espírito de grupo
e aumentar o comprometimento do aluno.
ES: Como o relacionamento do tutor com o professor pode ser melhorado?
É importante que o tutor tenha autonomia para fazer adaptações de pontos
que não sejam favoráveis ou que não estejam surtindo o efeito esperado. O
conteúdo produzido pode ser de difícil compreensão ou inadequado, por
exemplo, e quando o tutor tem autonomia pode dar esse tipo de feedback para
o coordenador de curso. Do contrário, o tutor se sente desmotivado e todo
o processo acaba sendo prejudicado.
ES: Qual a sua avaliação do futuro da educação a distância?
A instituição que não está na educação a distância está ficando para trás.
Toda instituição tem de ter uma operação nessa área, ainda que seja
pequena. Isso porque, como já disse, vai chegar um tempo em que a distinção
entre educação a distância e educação presencial vai deixar de existir.
Hoje a lei já permite que 20% do conteúdo no curso presencial seja ofertado
a distância. Mas é fundamental a qualidade e não focar exclusivamente o
lucro. A educação a distância é um caminho sem volta.
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